"Deputado Federal Ivan Valente:
Senhor Presidente, senhoras e senhores Deputados,
Nesta segunda-feira, mais um setor público estratégico para
o desenvolvimento do país foi entregue ao capital estrangeiro. Contrariando seu
discurso de campanha, a presidenta Dilma Rousseff privatizou os três maiores e
mais rentáveis aeroportos do país: Cumbica, Viracopos e Brasília, que
respondem, juntos por 30% dos passageiros, 57% do volume de cargas e 19% das
aeronaves que passam pelos terminais brasileiros. Juntos os três aeroportos
também são responsáveis por 70% do faturamento da Infraero, sustentando a rede
de aeroportos regionais em operação em todo o país.
A justificativa do governo é a de que não havia caixa no
orçamento público para garantir os investimentos nos três aeroportos na
velocidade necessária para a Copa de 2014. O que não se diz é que foi o
dinheiro público, através do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e
Social (BNDES), que financiou a privatização, emprestando aos compradores
internacionais para que estes participassem do leilão desta segunda-feira.
Oras, se o BNDES estava disposto a fazer empréstimos para financiar
investimentos nos aeroportos, por que não fazer isso através da Infraero, uma
empresa pública, estatal, que administra 66 aeroportos no país? O papel de um
banco como este é ajudar o desenvolvimento do país e a iniciativa privada e
estrangeira?
Também não se explica como a Infraero agora subsidiará
investimentos nos demais aeroportos do país, a maioria deficitária. Hoje,
apenas cerca de 20 aeroportos do país são rentáveis e mantém os demais com
repasse de verba, no esquema de subsídios cruzados, diminuindo as desigualdades
regionais e sociais do país. Ou seja, até agora, a lucratividade – crescente,
vale lembrar – de Cumbica, Viracopos e Brasília era fundamental para manter
todo o sistema aéreo em bom funcionamento no país. Como o governo pretende
enfrentar agora este déficit?
O Planalto diz que, além do valor arrecadado com o leilão,
os consórcios recolherão anualmente uma contribuição ao sistema que varia de 2%
a 10% da receita bruta de cada aeroporto. Mas essa arrecadação vai para o Fundo
Nacional de Aviação Civil (FNAC), que deve destinar recursos a projetos de
desenvolvimento e fomento da aviação civil. Sequer o funcionamento do FNAC foi
definido; será regulamentado posteriormente por decreto, numa completa falta de
transparência sobre a utilização desses recursos. Ou seja, esse dinheiro não
vai para a Infraero, senhor Presidente, e os demais aeroportos seguirão sem o
aporte que recebiam anteriormente.
Nem com os recursos que a suposta benéfica privatização dos
aeroportos gerará ao país o governo parece estar preocupado. Antes da revisão
feita pelo Tribunal de Contas da União nos valores mínimos para leilão dos três
terminais, o que se apresentava na Minuta do Edital eram módicas quantias de R$
2,3 bilhões para Cumbica, R$521 milhões para Viracopos e absurdos R$75 milhões
para Brasília.
Há ainda um grande risco para os trabalhadores do setor. O
Sindicato Nacional dos Aeroportuários (SINA) tentou barrar o pregão na Justiça,
afirmando que o edital do leilão descumpria o acordo firmado com a Agência
Nacional de Aviação Civil (ANAC) durante a última greve, que garantia a
estabilidade dos trabalhadores da Infraero nos terminais privatizados. O
contrato de concessão diz apenas que “a concessionária deverá desenvolver um
plano de transferência operacional a fim de assegurar uma transição eficaz das
operações aeroportuárias”. Ou seja, não há qualquer garantia para os
trabalhadores, que precisarão recorrer à Justiça – a mesma que manteve o leilão
– caso seus direitos trabalhistas não sejam garantidos, o que há grandes
chances de ocorrer. As precarizações e demissões são iminentes. Por isso, já
estamos requerendo audiência com o Ministério Público do Trabalho da 10ª Região
em Brasília.
Nosso mandato participou inclusive de uma audiência do
Comitê Contra as Privatizações de Aeroportos com o Procurador Paulo Gomes, do
Ministério Público Federal em Campinas. O MPF está estudando os impactos
urbanísticos das privatizações e intervenções motivadas pelos grandes eventos e
já levantou uma série de problemas em relação ao aspecto ambiental das obras
previstas para estes aeroportos. Em Viracopos, por exemplo, das cerca de 70
medidas previstas para amenizar os impactos ambientais, apenas 2 foram
cumpridas até agora. O restante virou “exigência” do processo.
Ao contrário do que afirma a grande imprensa – entusiasta
histórica das privatizações no país – sequer os passageiros sairão ganhando com
a entrega da Cumbica, Viracopos e Brasília às empresas estrangeiras. Está
prevista no contrato de concessões a cobrança de taxas de conexão nesses
aeroportos, o que não era feito anteriormente pela Infraero. Alguém duvida que
essa taxa será imediatamente repassada pelas companhias aéreas para o preço das
passagens, ou seja, para o bolso do consumidor, afetando sobretudo as classes
menos favorecidas, que recentemente passaram a utilizar o transporte aéreo?
Sobre isso, o cidadão brasileiro não foi consultado, apesar de o país ser
signatário de documentos da Organização da Aviação Civil Internacional (OACI)
que prevêem a consulta aos usuários de aeroportos em caso de aumento ou criação
de novas tarifas.
Vale lembrar que a crise aérea que atingiu o país nos
últimos anos foi gerada por problemas causados sobretudo por etapas do
transporte de passageiros sob responsabilidade, sobretudo, das empresas aéreas,
como overbooking e atrasos no check in. A ANAC, que deveria ter agido de
imediato, foi omissa, afetando milhares de pessoas. O que não justifica, no
entanto, é usar este tipo de problema para privatizar a gestão e operação dos
aeroportos.
Há ainda um risco para a qualidade e segurança das
operações, já que o transporte aéreo passará a ser orientado pelo lucro dessas
empresas. Lucros estes que serão remetidos para o exterior, em vez de ficarem
no mercado brasileiro e gerarem emprego e renda para a nossa população.
Por fim, senhoras e senhores Deputados, toda essa entrega do
patrimônio público nacional se dá colocando em risco a própria soberania
nacional. O artigo 170 da nossa Constituição Federal é muito claro ao tratar da
vulnerabilidade de zonas fronteiriças aéreas. Mas o governo Dilma parece
ignorar essa questão, ao passar para as mãos de empresas estrangeiras o
controle da entrada de bens e pessoas no país, com o agravante da proximidade
da Copa do Mundo e das Olimpíadas, quando o fluxo de cargas e passageiros
aumentará significativamente no país sem poder de ingerência do Estado
brasileiro nesses aeroportos.
Diante de tamanhos problemas, não é possível achar que o
país fez um bom negócio ao privatizar seus três principais aeroportos. A
aviação nacional está em plena ascensão. Em 2011, os terminais de cargas
registraram um aumento de 5,4% em seu volume transportado. Viracopos teve um
aumento de 35,9%, e Cumbica, de 28%. Mas o governo Dilma preferiu fechar os
olhos e se livrar de um suposto futuro problema, com a chegada da Copa de 14.
Saiu perdendo o país como um todo, que entregou de bandeja
mais uma vez seu patrimônio público para estrangeiros, com prejuízos para os
trabalhadores e os consumidores, e riscos à soberania nacional.
Muito obrigado.
Ivan Valente
Deputado Federal PSOL/SP"
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